RESUMO

O presente artigo tem como objetivo discutir os limites e prejuízos trazidos pela Lei nº 13.467/12017, conhecida como Reforma Trabalhista, em relação às negociações individuais e coletivas em razão da possibilidade das negociações sobrepuserem o legislado em inúmeros direitos trabalhistas os quais não houve a ressalva do legislador, bem como discutir a autonomia da vontade na negociação individual ante possibilidade da negociação individual ao trabalhador que perceba salário superior ao Regime Geral de Previdência Social e tenha diploma de curso superior como também trouxe a prevalência da norma coletiva em relação a lei em diversos direitos do trabalhador, discutido especialmente os alcances e limites descritos na redação atual dos artigos 444 e 611-A e 611-B, que possibilitaram a redução de direitos trabalhistas, inclusive àqueles que estão ligados a segurança e saúde do trabalhador.

Palavras-chave: Reforma Trabalhista – Limites da Prevalência do Negociado sobre o Legislado.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ……………………………………………………………………………………………………………………13
OBJETIVO DA NEGOCIAÇÃO COLETIVA ……………………………………………………………………..14
NATUREZA JURÍDICA ……………………………………………………………………………………………………..16
DIFERENÇA DAS CONVENÇÕES COLETIVAS DOS ACORDOS COLETIVOS DE TRABALHO ……………………………………………………………………………………………………………………….17
PROTEÇÃO DO TRABALHADOR ……………………………………………………………………………………18
DA FLEXIBILIZAÇÃO DO PRINCÍPIO DA IRRENUNCIABILIDADE OU INDISPONIBILIDADE DOS DIREITOS TRABALHISTAS ……………………………………………….19
LIMITES DA NEGOCIAÇÃO COLETIVA ………………………………………………………………………..19
DA PREVALÊNCIA SOBRE A LEI …………………………………………………………………………………..20
DO CONTROLE JUDICIAL DA NEGOCIAÇÃO COLETIVA ………………………………………….27
O QUE NÃO PODE SER OBJETO DE NEGOCIAÇÃO COLETIVA …………………………………28
A REFORMA TRABALHISTA E SUAS INOVAÇÕES ………………………………………………………29
DAS NEGOCIAÇÕES COLETIVAS E A FAZENDA PÚBLICA ………………………………………..33
A INDEPENDÊNCIA SINDICAL NA NEGOCIAÇÃO ………………………………………………………35
DA DISCUSSÃO NO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL SOBRE O PRINCÍPIO DA ………35 PREVALÊNCIA DA NEGOCIAÇÃO COLETIVA – RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO (ARE) 1121633 …………………………………………………………………………………………………35
CONCLUSÃO ………………………………………………………………………………………………………………….36
BIBLIOGRAFIA ………………………………………………………………………………………………………………37
1. INTRODUÇÃO.
A lei 13.467/17, sancionada em 13 de julho de 2017 e em vigor a partir de 11 de novembro de 2019, a chamada Reforma Trabalhista, reformulou substancialmente a abrangência e validade das negociações individuais e coletivas que, nos termos da atual legislação, terão prevalência sobre a lei, salvo nos casos expressos descritos na própria lei.
Nas palavras de VOLIA1, “o objetivo da negociação coletiva é o de adequar as relações trabalhistas à realidade enfrentada pelos interessados, que se modifica a cada dia, base territorial e empresa e época. Busca a harmonia temporária dos interesses antagônicos. Assim, é possível a criação de benefícios não previstos em lei, a supressão destes mesmos benefícios ou sua modificação. A negociação irã adequar-se ao campo que encontrar para pauta de reinvindicações para retração de direito”.
Até a entrada em vigor da lei 13.467/2017, o Poder Judiciário não reconhecia a retração de direitos, ainda que previstos em convenções e acordos coletivos, ou seja, as normas coletivas eram consideradas eficazes apenas quando regravam a concessão de benefícios superiores ou adicionais aos previstos em lei.
Inúmeros foram os acordos coletivos e convenções coletivas que, questionados na justiça, tiveram sua eficácia mitigada, alterando acordos já estabelecidos, impossibilitando maior segurança jurídica nos acordos firmados.
Agora, com a determinação expressa que as convenções coletivas de trabalho e acordos coletivos de trabalho terão prevalência sobre a lei nos assuntos por ela delimitados, como, por exemplo, banco de horas, jornada de trabalho, troca de dia de feriados, entre outros, haverá a possibilidade legal de redução de direitos legais.
A lei também trouxe a possibilidade de livre negociação do Contrato de Trabalho, de forma individual, dos empregados portadores de diploma de nível superior e que percebam salário mensal igual ou superior a duas vezes o limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social.
Portanto, a Lei nº 13.467/17 não só permitiu a possibilidade da negociação individual dos trabalhadores com diploma de nível superior e que recebam acima de duas vezes o limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social, em 25/05/2018, no valor de R$ 11.291,60 (onze mil, duzentos e noventa e um reais e sessenta centavos).
1 CASSAR, Vólia Bonfim. Direito do Trabalho: de acordo com a reforma trabalhista. Lei 13.467/17. 15ª ed. Revistada, atualizada e ampliada. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2018. P. 1244.
A Reforma Trabalhista também buscou coibir o ativismo judicial, de forma a impedir que o Poder Judiciário crie normas ou modifique acordos celebrados.
2. A NEGOCIAÇÃO COLETIVA NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 E CLT COM AS ALTERAÇÕES ADVINDAS DA REFORMA TRABALHISTA (LEI 13.467/2017).
O artigo 7º da Constituição Federal de 1988, dedicado aos Direitos Sociais, enumera trinta e oito direitos sociais aos trabalhadores constitucionalmente tutelados, prevendo, em alguns deles, que sua modificação somente seria possível ser realizada por meio de acordos ou convenções coletivas. Neste sentido, podemos destacar a irredutibilidade do salário e a jornada de trabalho.
Estes direitos, ainda que constitucionalmente reconhecidos, podem ser alterados por meio de convenções coletivas ou acordos coletivos de trabalho.
Esta foi uma opção legislativa lastreada nas dimensões continentais do Brasil e sua grande variedade de atividades, o que tornou impossível que se legislasse de forma a atender de forma detalhada todas as categorias de profissionais e meios de produção existentes.
É certo que o mesmo arcabouço jurídico que atendesse o comércio não atenderia a indústria e a legislação que atendesse a indústria não conseguiria atender o agronegócio ou trabalho portuário.
Assim, ante a grande variedade de situações e uma enorme resistência do Poder Judiciário em ratificar acordos e convenções coletivas quando estas reduzissem direitos, foi necessária a alteração legislativa, para que as condições estabelecidas em acordo coletivo ou convenções coletivas de trabalho prevaleçam sobre lei, bem como para que os acordos coletivos de trabalho prevaleçam sobre as convenções coletivas de trabalho, quando simultâneas.
Isto porque o Poder Judiciário, pelo princípio da prevalência da norma mais favorável, em uma superproteção do trabalhador, utilizava-se da antiga redação do art. 620 da CLT, que detinha a palavra “quando” ao invés de “sempre”, o qual permitia que o judiciário determinasse a aplicação sempre da norma mais favorável, sendo necessária a alteração do artigo 620 para que o acordo coletivo prevalecesse em relação à convenção coletiva de trabalho.
A Convenção Coletiva, conforme definição de Carrion citando Alfredo Montoya Melgar, in Derecho del Trabalho, Madrir diz que
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é um pacto subscrito entre associações sindicais de trabalhadores, de um lado, e empresários ou organizações associativas destes, de outro lado, através do qual fixam as condições pelas quais hão de reger-se as relações singulares de trabalho incluídas em seu âmbito de aplicação2.
Desta forma, a Lei 13.467/2017, a Reforma Trabalhista, privilegiou as convenções e acordos coletivos, dividindo o antigo art. 611 em 611-A e 611-B. O primeiro exemplificou os temas que podem ser objetos de negociação coletiva ou acordo coletivo. Já o segundo, repetindo o contido no art. 7º da Constituição Federal, os assuntos os quais não poderão ser objeto de negociação coletiva.
A Lei 13.467/2017 também trouxe limites a atuação do judiciário que não poderá anular cláusulas ou convenções coletivas e acordos coletivos, salvo em caso de ilicitudes, ilegalidades ou vícios de representação.
Também pôs fim a ultratividade dos Acordos ou Convenções Coletivas de Trabalho que, nos termos da Súmula 277 do TST, as cláusulas normativas dos acordos coletivos ou convenções coletivas integram os contratos individuais de trabalho e somente poderão ser modificadas ou suprimidas mediante negociação coletiva de trabalho.
Este era um conceito, Sumulado pelo Tribunal Superior do Trabalho, que já era objeto de discussão no Supremo Tribunal Federal, no autos da ADPF nº 323/DF, de relatoria do Ministro Gilmar Mendes, na qual foi concedida liminar para suspender a aplicação do enunciado dessa súmula, e que agora, conforme a redação do § 3º do art. 614 da Lei 13.467/2017, fixa um prazo máximo de 2 (dois) anos para a validade dos acordos e convenções coletivos, vedando expressamente a ultratividade.
3. OBJETIVO DA NEGOCIAÇÃO COLETIVA.
Embora não exista um conceito legal do significado de negociação coletiva, entende-se que se trata de importante instrumento de resolução de conflitos entre litigantes. Em outras palavras, no âmbito do Direito do Trabalho, a negociação coletiva revela-se por meio do entendimento entre empregados e trabalhadores visando solucionar interesses opostos ou conflitantes.
A negociação coletiva tem por principal objetivo atingir um consenso entre litigantes, encerrando eventual conflito existente a partir do consenso entre as partes, objetivando melhorias das condições de trabalho ou alterações momentâneas nestas condições de trabalho.
2 CARRION, Valentin. Comentários à Consolidação das Leis Trabalhistas: Legislação Complementar, jurisprudência. Ed. 43. São Paulo: Saraiva Educação, 2019. P. 520
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Nas palavras de Vólia Bomfim:
O objetivo da negociação coletiva é o de adequar as relações trabalhistas à realidade enfrentada pelos interessados, que se modifica a cada dia, base territorial, empresa e época. Busca a harmonia temporária dos interesses antagônicos. Assim, é possível a criação de benefícios não previstos em lei, a supressão destes mesmos benefícios ou sua modificação. A negociação irá adequar-se ao campo que encontrar para pauta de reivindicações para retração de direitos. Todavia, excepcionalmente, quando for o caso de comprovada dificuldade econômica, o empregador poderá propor a flexibilização de certos direitos3.
Ademais, a negociação coletiva pode ter função normativa, social, compositiva, obrigacional, política, econômica ou pedagógica.
Desse modo, vê-se que a negociação coletiva é importante instrumento de solução célere de conflitos entre litigantes, desde que sejam observados os parâmetros dos artigos 611-A e 611-B da CLT.
4. NATUREZA JURÍDICA.
Não há um consenso na doutrina sobre a natureza jurídica da negociação coletiva.
Sobre o tema, LEITE afirma que
No direito estadunidense, a negociação coletiva é ora tratada como um procedimento (collective bargaining), ora como acordos bem-sucedidos (collective bargaining agreements), o que, de certo modo, acabou influindo a mens legislatoris, devido à influência da concepção norte americana em nosso país, especialmente no setor automobilístico.
[…] No Brasil, parece-nos que a natureza jurídica da negociação coletiva constitui autêntico instrumento decorrente do poder negocial coletivo, conferido aos sindicatos representativos das categorias profissionais e empregadores ou sindicatos representativos das categorias econômicas para que promovam a defesa dos interesses coletivos dos seus Representados4.
Em suma, com base na posição doutrinária acima citada, é de se entender que a natureza jurídica da negociação coletiva é instrumental, ou seja, trata-se de expediente por meio do qual é exercida a autonomia privada coletiva de certa categoria laboral.
3 CARRION, Valentin. Comentários à Consolidação das Leis Trabalhistas: Legislação Complementar, jurisprudência. Ed. 43. São Paulo: Saraiva Educação, 2019. P. 231.
4 LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Curso de direito do trabalho. 11ª ed. São Paulo: Saraiva, 2019. P. 1211-1212.
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5. DIFERENÇA DAS CONVENÇÕES COLETIVAS DOS ACORDOS COLETIVOS DE TRABALHO.
Para a melhor compreensão dos termos aqui utilizados, mister se faz a correta distinção do que se entende por Convenção Coletiva de Trabalho e Acordo Coletivo de Trabalho.
O acordo coletivo, em síntese, pode ser conceituado como sendo o instrumento normativo decorrente de negociação coletiva, firmado entre sindicato de categoria profissional com uma ou mais empresas.
A principal diferença entre o acordo e a convenção coletiva está na circunstância de que a convenção coletiva é mais abrangente, ampla, ou seja, envolve sindicatos de ambas as categorias, enquanto o acordo é considerado mais restrito, abrangendo apenas empregados da empresa ou empresas que eventualmente o celebrem.
Há de se destacar que o ponto comum de ambos instrumentos de negociação coletiva reside no fato de que possuem efeito erga omnes. Além disso, o acordo e a convenção coletiva do trabalho são considerados mecanismos de flexibilização do contrato de trabalho, reivindicados pelos empregadores com o fim de diminuir a atuante intervenção estatal no direito dos trabalhadores, sob o argumento de que, com essa flexibilização, seria viável a manutenção de empregos durante a crise econômica que atingia o país, especialmente no ano de 2017.
A flexibilização é facilmente notada por meio da possibilidade de que os instrumentos coletivos do trabalho tenham prevalência sobre a lei nas hipóteses previstas no artigo 611-A. Argumento favorável à essa concessão é no sentido de que possibilitará maior dinamismo e atualidade à obsoleta legislação pátria. De outra parte, os artigos 611-A e 611-B da CLT também receberam diversas críticas no sentido de que trariam inúmeros prejuízos aos trabalhadores.
Por fim, conforme já mencionado, o acordo coletivo de trabalho, que é específico para uma empresa e seu conjunto de trabalhadores terá prevalência sobre a convenção coletiva de trabalho da categoria.
Exemplificando, o acordo coletivo de trabalho celebrado entre a empresa GOL LINHAS AÉREAS S.A. com o Sindicato Nacional dos Aeronautas terá prevalência em relação à Convenção Coletiva de Trabalho celebrada entre o Sindicato Nacional dos Aeronautas e o Sindicato Nacional das Empresa Aeroviárias, quando ambos tiverem vigências concomitantes, conforme preceitua o art. 620 da CLT.
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6. PROTEÇÃO DO TRABALHADOR.
Também se faz necessário compreender o princípio tutelar, popularmente conhecido como princípio protetor, este que constitui um dos pilares do Direito do Trabalho, cujo escopo, em síntese, consiste no estabelecimento de igualdade jurídica entre empregado e empregador, especialmente em razão da vulnerabilidade jurídica do primeiro.
O princípio em exame, aliás, se fraciona em outros três princípios: 1) in dubio pro operário; 2) condição mais benéfica e; 3) norma mais favorável. Resumidamente, esses princípios podem ser conceituados da seguinte forma:
O primeiro, in dubio pro operario, visa garantir que em eventual norma jurídica que admita mais de uma interpretação, se adote a interpretação que melhor favoreça o empregado.
O segundo, princípio da condição mais benéfica, corolário do princípio da segurança jurídica, deve ser manejado quando houver uma condição ou cláusula anterior, e sobrevier nova norma que regule a mesma matéria, devendo prevalecer a norma que apresente a condição mais benéfica ao empregado/trabalhador. Trata-se de regra comumente aplicável em casos de direito intertemporal, concorrendo norma anterior e posterior.
Por último, o princípio da norma mais favorável estabelece que existindo mais de uma norma jurídica que trate de direitos trabalhistas, predominará a que melhor resguarde os direitos do trabalhador. Sobre o tema, CARLOS HENRIQUE BEZERRA LEITE ensina que
o direito do trabalho adota a teoria dinâmica da hierarquia entre as normas trabalhistas, pois no topo da pirâmide normativa não estará necessariamente a Constituição, e sim a norma mais favorável ao trabalhador5.
5 LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Curso de direito do trabalho. 11ª ed. São Paulo: Saraiva, 2019, pág. 140.
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7. DA FLEXIBILIZAÇÃO DO PRINCÍPIO DA IRRENUNCIABILIDADE OU INDISPONIBILIDADE DOS DIREITOS TRABALHISTAS.
Flexibilizar significa tornar flexível, tornar menos rígido. Em regra, na vigência do contrato de trabalho os direitos irrenunciáveis em razão da condição de subordinação e hipossuficiência do empregado com relação ao empregador.
Antes da Reforma Trabalhista, eram raros os casos em que o empregado poderia ceder seus direitos. Entretanto, com o advento dessa alteração legislativa, os ajustes individuais e coletivos entre empregado e empregador foram ampliados.
A título de exemplo, temos a compensação de jornada prevista no artigo 59, § 6º, da CLT, o banco de horas semestral do art. 59, § 5º, da CLT, o fracionamento de férias do art. 134, § 1º, da CLT, alteração do regime presencial para o teletrabalho prevista no art. 75-C, § 1º, CLT e o empregado “hipersuficiente” do artigo 444, parágrafo único cc. 611-A, CLT.
No tocante ao Direito Coletivo do Trabalho, o principal dispositivo legal que regula a flexibilização de direitos trabalhistaq é o artigo 611-A da CLT.
Desse modo, vê-se que o princípio da indisponibilidade dos direitos trabalhistas restou flexibilizado após a Reforma Trabalhista, diminuindo a intervenção estatal nas relações de trabalho.
8. LIMITES DA NEGOCIAÇÃO COLETIVA.
A Lei 13.467/2017, popularmente conhecida como Reforma Trabalhista, teve como um dos seus principais pilares a prevalência da convenção coletiva e do acordo coletivo do trabalho sobre a lei, apresentando um rol exemplificativo, tanto das possibilidades quanto do que não poderia ser negociado em convenção coletiva de trabalho e acordo coletivo de trabalho.
Desta forma, pode-se dizer que a negociação coletiva não é um instrumento absoluto, ilimitado, devendo observar os parâmetros impostos pela lei, insculpidos nos artigos 611-A e 611-B da CLT.
Cumpre ainda ressaltar que ocorrendo violação ao núcleo dos direitos do trabalhador, o Poder Judiciário poderá intervir a fim de resguardar a legalidade, razoabilidade e proporcionalidade.
No tocante aos limites, embora existam negociações coletivas no âmbito do Direito do Consumidor, em regra, a negociação coletiva somente pode tratar de matérias trabalhistas.
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Além disso, as negociações coletivas devem tratar dos direitos transindividuais dos integrantes da categoria profissional por ela abrangida.
Nesse passo, a negociação coletiva não pode atingir direitos fundamentais assegurados ao empregado na qualidade de cidadão. A título de exemplo, não se pode admitir negociação coletiva que viole o direito à igualdade, que prejudique o direito adquirido, a intimidade, a honra, a imagem etc.
Não é permitido, também, que uma negociação coletiva viole direitos laborais considerados mínimos, protegidos por lei, como o salário mínimo, repouso semanal remunerado, número de dias de férias devidas ao empregado, normas de saúde, higiene e segurança do trabalho previstas em lei ou em normas regulamentadoras do Ministério do Trabalho, entre outros direitos previstos expressamente no artigo 611-B da CLT, em rol taxativo.
Por fim, a negociação coletiva não pode ferir direitos alheios, inclusive o direito de tributar por parte do Estado.
Vê-se, portanto, que apesar de a negociação coletiva ter flexibilizado o Direito Coletivo do Trabalho, ainda assim deverá observar limites mínimos previstos na Constituição Federal e, especificamente, no artigo 611-B da CLT.
9. DA PREVALÊNCIA SOBRE A LEI.
Nas hipóteses previstas no rol exemplificativo do artigo 611-A da CLT, a convenção e o acordo coletivo do trabalho têm prevalência sobre a lei quando tratarem sobre pacto quanto à jornada de trabalho, observados os limites constitucionais, banco de horas anual, intervalo intrajornada, adesão ao Programa de Seguro-Emprego da Lei 13.189/15, regulamento empresarial, teletrabalho, regime de sobreaviso, troca do dia de feriado, participação nos lucros ou resultados da empresa etc.
Assim, de forma a elencar o rol disposto no art. 611-A com elementos que permitam uma melhor compreensão destes.
Art. 611-A. A convenção coletiva e o acordo coletivo de trabalho têm prevalência sobre a lei quando, entre outros, dispuserem sobre:
O Art. 611-A da CLT é expresso no sentido de que, o acordo coletivo de trabalho prevalecerá sobre a lei no rol exemplificativo disposto no referido artigo.
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Cumpre destacar que o rol é exemplificativo, conforme denota-se da expressão “entre outros”, contida em seu caput.
Vejamos algumas das possibilidades:
I – pacto quanto à jornada de trabalho, observados os limites constitucionais;
A CF/88 determina que a jornada de trabalho não poderá ultrapassar 08 horas diárias, admitindo-se o acréscimo extraordinário de 02 horas e 44 horas semanais.
Assim, as partes, por meio de acordos e convenções coletivas poderão ajustar melhor a jornada de trabalho de forma a atender os interesses das empresas e trabalhadores.
Neste sentido, cita-se como exemplo a Categoria de Restaurantes de Belo Horizonte/MG que pactuou que o intervalo intrajornada seria de 3 horas, possibilitando que a jornada de trabalho se compatibilizasse com a necessidade do estabelecimento, permitindo que o mesmo trabalhador atenda tanto o horário do almoço como também o jantar. Para o trabalhador, a medida também foi vantajosa eis que no mesmo dia de trabalho este participa do recebimento das gorjetas dos dois turnos.
Cumpre rememorar que a jurisprudência já admitia a jornada 12×36 e hoje, nos termos do art. 59-A6 da CLT, a jornada 12×36 passa a ser legalmente tutelada, possibilitando, inclusive, que esta seja pactuada em acordo individual, exigindo-se, tão somente que este seja escrito.
II – banco de horas anual;
O Banco de Horas, que nada mais é do que a compensação de horas excedentes à jornada pela redução da jornada em outro dia, em sistema de créditos e débitos do tempo extraordinário à jornada, antes da Lei nº 13.467/17 (Reforma Trabalhista), somente poderia ser realizado se previsto em acordo ou convenção coletiva da categoria.
Inúmeras foram as demandas judiciais em que se discutia a validade e prazo do banco de horas e estas, muitas vezes, terminavam em condenações às empresas ao pagamento das horas extras com o acréscimo legal ou convencional, o que fosse de percentual maior.
6 Art. 59-A. Em exceção ao disposto no art. 59 desta Consolidação, é facultado às partes, mediante acordo individual escrito, convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho, estabelecer horário de trabalho de doze horas seguidas por trinta e seis horas ininterruptas de descanso, observados ou indenizados os intervalos para repouso e alimentação.
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Neste particular, a Reforma Trabalhista foi um avanço, na medida em que autorizou que o banco de horas contabilizado e compensado no mesmo mês fosse realizado, de forma tácita ou escrita. Já para a compensação no prazo de até seis meses, exigiu-se que o pacto fosse por escrito. Por fim, permitiu-se ainda a compensação anual, exigindo-se, para este, que o pacto fosse celebrado por meio de Acordos ou Convenções Coletivas.
III – intervalo intrajornada, respeitado o limite mínimo de trinta minutos para jornadas superiores a seis horas;
Outra mudança de enorme avanço foi a possibilidade de o sindicato de determinada categoria acordar pela redução ou aumento do intervalo intrajornada, de forma a atender os interesses das partes acordantes, empresas e empregados.
Já foi citado o exemplo do Sindicato dos Restaurantes de Belo Horizonte/MG. Outra situação bem corriqueira é a redução do intervalo intrajornada, possibilitando que o trabalhador encerre a sua jornada mais cedo, permitindo que este, principalmente nos grandes centros urbanos, consiga chegar em sua residência em tempo muito menor do que se saísse no horário de maior movimento. Ou seja, determinada atividade poderia pactuar para realizar o seu labor com intervalo intrajornada de 30min e, em contrapartida, deixar o trabalho às 17:30 e não às 18hs, como usualmente acontece.
É certo que estas adequações precisam ser ajustadas pelo sindicato que representa a categoria e que, eleita por seus pares, conhece bem aquela atividade.
No comércio, por exemplo, seria inviável a redução da jornada considerando a necessidade do estabelecimento se manter aberto até determinado horário. Já outra categoria, como por exemplo os escritórios de contabilidade, poderiam encerrar mais cedo sem prejuízo da sua atividade.
IV – adesão ao Programa Seguro-Emprego (PSE), de que trata a Lei no 13.189, de 19 de novembro de 2015;
O Programa Seguro-Emprego, criado em 2015 pela Lei nº 13.189, tinha como objetivo auxiliar os trabalhadores na preservação do emprego em momentos de retração da atividade econômica, favorecer a recuperação econômico-financeira das empresas, permitindo que as empresas reduzam a jornada de trabalho e salários em até 30% (trinta por cento) por até seis meses, podendo ser prorrogado por períodos de seis meses, desde que o período total não ultrapasse vinte e quatro meses, ficando a empresa que aderisse ao PSE proibida de dispensar
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os empregados que tiverem sua jornada de trabalho no período correspondente a 1/3 (um terço) do período de adesão.
A adesão ao PSE também é um item que a Lei nº 13.467/17 permitiu que fosse objeto de Acordo ou Convenção Coletiva de Trabalho.
Contudo, rememora-se que a Lei 13.189/2015 é temporária. O PSE se encerrou em dezembro de 2018, ficando pendente uma nova lei que o prorrogue ou o reedite.
V – plano de cargos, salários e funções compatíveis com a condição pessoal do empregado, bem como identificação dos cargos que se enquadram como funções de confiança;
Uma questão tormentosa é a exata definição do que seria “cargo de confiança”, o que ficava à interpretação do Poder Judiciário em compreender se determinada função ou determinado empregado efetivamente atuaria como um longa manus do empregador e se encontraria na excepcionalidade do art. 62, II, da CLT ou não.
Para tanto, verificava-se qual era a extensão do poder de mando daquele empregador. Algumas decisões entendiam que o simples fato de o empregado atuar como gerente da equipe, estabelecimento ou setor já lhe conferia a condição de empregado de confiança. Outras decisões, contudo, entendem que somente seria empregado de confiança àquele com poderes diretivos com a possibilidade de contratar ou demitir pessoal.
Assim, objetivando maior segurança jurídica, determinar que cargo ou função se enquadraria como função de confiança agora é uma possibilidade negocial sindical.
VIII – teletrabalho, regime de sobreaviso, e trabalho intermitente;
O teletrabalho, inovação legislativa descrita nos artigos 75-A a 75-E, trata esta modalidade de prestação de serviço, que é o labor fora das dependências do empregador, com a utilização de tecnologia da informação e de comunicação que, por sua natureza, não se constituam como trabalho externo, é uma norma geral e que certamente necessitará de uma maior regulamentação dada a grande variedade de categorias profissionais que poderiam trabalhar nesta modalidade remota.
Assim, esta maior regulamentação poderá ser realizada por instrumentos coletivos, como o acordo ou convenção.
O mesmo pode-se dizer do trabalho intermitente, outra inovação legislativa advinda da Reforma Trabalhista que criou uma modalidade de Contrato de Trabalho chamada de
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Contrato de Trabalho intermitente, definido por lei como o contrato de trabalho no qual a prestação de serviços, com subordinação, não é contínua, ocorrendo com alternância de períodos de prestação de serviços e de inatividade, determinados em horas, dias ou meses, independentemente do tipo de atividade do empregado e do empregador, exceto para os aeronautas, regidos por legislação própria.
Ainda que o art. 452-A e da CLT apresente a forma de elaboração, controles e garantias, deveres e direitos das partes, por meio de Acordos ou Convenções Coletivas de Trabalho, poderá ser admitida, por exemplo, garantia mínima de remuneração ao intermitente quando não convocado, afastando a nefasta situação do zero-hora trabalhada – zero salário, garantindo ao trabalhador o direito ao mínimo existencial.
IX – remuneração por produtividade, incluídas as gorjetas percebidas pelo empregado, e remuneração por desempenho individual;
A Reforma Trabalhista melhor detalhou o que compõe a remuneração, como as gorjetas, bem como aquilo que não integraria a remuneração, como a ajuda de custo, auxílio-alimentação, prêmios, etc.
Contudo, especificidades como a forma de pagamento, periodicidade, rateios, etc, não estão descritos na lei, ante a impossibilidade de prever todas as possibilidades para cada um dos itens.
Para tanto, as empresas e empregados poderão se valer dos instrumentos coletivos para detalhar as especificidades de cada caso.
A título de exemplo, por meio de acordo ou convenção coletiva, poderá ser pactuado o percentual de rateio da gorjeta e se outros profissionais como caixa, cozinha, auxiliares, etc., que também compõe o bom atendimento, se receberão ou não a gorjeta paga pelo cliente satisfeito.
X – modalidade de registro de jornada de trabalho;
Usualmente o registro de ponto é realizado dentro do estabelecimento no qual se iniciará a jornada.
Contudo, isto nem sempre é possível. Um instrutor de voo pode iniciar sua jornada em local diverso do estabelecimento empregador. Os operários da construção civil iniciam o seu labor na obra.
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Como se vê, seria impossível ao legislador prever e legislar sobre cada possibilidade de acordo com a especificidade da categoria profissional.
Desta forma, para maior segurança jurídica, o legislador optou por transferir aos acordos convenções coletivas, que são representados pelo Sindicato das Categorias e Empresas, a melhor forma de regulamentar os detalhes necessários para a atividade.
Admite-se, por exemplo, que o registro da jornada seja estabelecido por exceção, ou seja, o empregado somente registra o horário extraordinário, reduzindo com isso a burocracia e custos de apuração de todos os pontos, quando, em verdade, somente as ausências e horas-extras é que interferirão na folha de pagamento.
Cumpre destacar que a Lei nº 13.874/2019, popularmente conhecida como a Lei da Liberdade Econômica, acrescentou parágrafos ao art. 74 da CLT, regulamentando o trabalho fora do estabelecimento, que poderá ter registro manual, mecânico ou eletrônico em seu poder, bem como o registro de ponto por exceção.
XI – troca do dia de feriado;
Este item foi muito debatido e criticado em relação à Reforma Trabalhista sob o fundamento de que se determinada categoria profissional alterar o dia da folga em razão do feriado, os empregados desta categoria ficarão excluídos do convívio social de seus familiares.
O espírito da lei não é esse. O objetivo maior foi permitir que um feriado fosse gozado próximo ao fim de semana, possibilitando um maior tempo de descanso do empregado, bem como ajustar a compensação da jornada na “ponte” do feriado, ajustando a jornada à produção.
Sobre este inciso, Homero destaca que
tecnicamente, o feriado não pode ser deslocado, porque a Lei nº 605/1949 manda que a compensação recaia sobre a mesma semana. Ao inserir feriado na negociação coletiva, a empresa obtém uma espécie de banco de horas só de feriados, o que é lícito e adequado ao papel dessa modalidade estendida de compensação de jornada7.
XII – enquadramento do grau de insalubridade;
7 SILVA, Homero Batista Mateus da CLT comentada. 2ª ed. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2018. P. 271
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Outra discussão caríssima ao Poder Judiciário por pagamento de peritos judicial, em processos individuais é o enquadramento do grau de insalubridade.
A lei busca uniformizar o enquadramento permitindo que os sindicatos negociem o enquadramento do grau de insalubridade.
Rememora-se que o sindicato é formado por integrantes daquela categoria, ou seja, conhecedor dos meandros da atividade e que ainda poderá contratar perícia para maior assertividade do enquadramento.
A medida é salutar e busca evitar discussões individuais que, frequentemente, ainda são conflitantes com outros processos envolvendo a mesma empresa e atividade.
Estas são as principais, mas não únicas, possibilidades de negociação que poderão prevalecer sobre a lei.
Cumpre ressaltar que, a fim de prestigiar a segurança jurídica, e impedir a rediscussão e anulação dos pactos firmados, a própria lei compreendendo que em momentos de crises econômicas os acordos e convenções podem não ser benéficos aos empregados dispôs que a inexistência de expressa indicação de contrapartidas em convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho não ensejará nulidade por não caracterizar vício do negócio jurídico.
Contudo, cláusulas que reduzam o salário ou a jornada necessitam de expressa proteção dos empregados contra dispensa imotivada durante o seu prazo de vigência.
A procedência de eventual ação anulatória de Cláusulas de Convenção Coletiva ou Acordo Coletivo ensejará, igualmente, anulação da Cláusula Compensatória, sem direito a repetição do indébito.
Outra situação muito corriqueira era a propositura de ações individuais discutindo acordos coletivos e convenções coletivas, especialmente os programas de demissão voluntárias (PDV).
Com o advento da Reforma Trabalhista, nas ações que tenham como objeto a anulação de cláusulas desses instrumentos os sindicatos subscritores participarão como litisconsortes necessários.
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10. DO CONTROLE JUDICIAL DA NEGOCIAÇÃO COLETIVA.
Como já dito, a negociação coletiva não é um instrumento ilimitado, obedecendo aos parâmetros previstos nos artigos 611-A e 611-B da CLT, de modo que, excepcionalmente, pode vir a ser apreciada pelo Poder Judiciário.
A título de exemplo, caso seja verificada a violação de liberdades individuais e direitos indisponíveis, o artigo 83, inciso IV, da LC nº 75/93 permite que o Ministério Público do Trabalho (MPT) proponha ação anulatória de cláusula de contrato, acordo coletivo ou convenção coletiva que viole as liberdades individuais ou coletivas ou os direitos individuais indisponíveis dos trabalhadores.
Entretanto, § 1º do artigo 611-A da CLT, novidade da Reforma Trabalhista, impõe limitação ao controle jurisdicional das negociações coletivas:
Art. 611-A. A convenção coletiva e o acordo coletivo de trabalho têm prevalência sobre a lei quando, entre outros, dispuserem sobre:
[…]
§ 1o No exame da convenção coletiva ou do acordo coletivo de trabalho, a Justiça do Trabalho observará o disposto no § 3o do art. 8o desta Consolidação.
[…]
Art. 8 […] § 3o No exame de convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho, a Justiça do Trabalho analisará exclusivamente a conformidade dos elementos essenciais do negócio jurídico, respeitado o disposto no art. 104 da Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil), e balizará sua atuação pelo princípio da intervenção mínima na autonomia da vontade coletiva.
Por meio dos dispositivos legais supracitados, nota-se que a negociação coletiva se aproxima dos negócios jurídicos do Código Civil, os quais são considerados meio de realização de vontades dos particulares, desde que cumpram os requisitos de validade, existência e eficácia, previstos no referido diploma legal.
O artigo 104 do Código Civil, por sua vez, preceitua que a validade do negócio jurídico pressupõe: agente capaz, objeto lícito, possível, determinado ou determinável, forma prescrita ou não defesa em lei.
Assim, a Justiça do Trabalho deve se limitar à análise da conformidade dos elementos essenciais do negócio jurídico, tendo como base os princípios da autonomia da vontade coletiva e intervenção mínima, exteriorizados pela Reforma Trabalhista.
Por outro lado, há quem defenda que, o artigo 611-A, § 1º, da CLT, é materialmente inconstitucional por violar o princípio do acesso à justiça e da inafastabilidade da jurisdição, previsto no artigo 5º, inciso XXXV, da Constituição Federa de 1988.
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Desse modo, diante de tais considerações, deve se entender que, excepcionalmente, as cláusulas das negociações coletivas podem ser discutidas no âmbito do Poder Judiciário, respeitando o espírito da Lei nº 13.467/2017.
11. O QUE NÃO PODE SER OBJETO DE NEGOCIAÇÃO COLETIVA.
Da mesma forma que o art. 611-A da CLT apresenta um rol exemplificativo do que pode ser objeto de negociação coletiva, o art. 611-B da CLT, impõe como objeto ilícito a negociação coletiva que venha a suprimir ou reduzir os seguintes direitos:
XXIII – proibição de trabalho noturno, perigoso ou insalubre a menores de dezoito anos e de qualquer trabalho a menores de dezesseis anos, salvo na condição de aprendiz, a partir de quatorze anos;
XXIV – medidas de proteção legal de crianças e adolescentes;
XXV – igualdade de direitos entre o trabalhador com vínculo empregatício permanente e o trabalhador avulso;
XXVI – liberdade de associação profissional ou sindical do trabalhador, inclusive o direito de não sofrer, sem sua expressa e prévia anuência, qualquer cobrança ou desconto salarial estabelecidos em convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho;
XXVII – direito de greve, competindo aos trabalhadores decidir sobre a oportunidade de exercê-lo e sobre os interesses que devam por meio dele defender;
XXVIII – definição legal sobre os serviços ou atividades essenciais e disposições legais sobre o atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade em caso de greve;
XXIX – tributos e outros créditos de terceiros;
XXX – as disposições previstas nos arts. 373-A, 390, 392, 392-A, 394, 394-A, 395, 396 e 400 desta Consolidação.
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Inicialmente cumpre destacar que embora o artigo utilize a expressão exclusivamente8, o rol é exemplificativo na medida em que deixou de incluir alguns direitos, princípios e valores constitucionais.
Em relação ao que não pode ser objeto de negociação coletiva, o art. 611-B da CLT trouxe o que já previa o art. 7º da CF/88, o qual versa sobre os direitos sociais, destacando os direitos dos trabalhadores que visem à melhoria de sua condição social.
Agora, além do rol contido no art. 611-B da CLT, por certo a negociação coletiva também não poderá violar outros direitos constitucionalmente tutelados, como o direito de personalidade e liberdades garantidas na Constituição.
Segundo Vólia:
não poderá, assim, a norma coletiva violar a dignidade, a intimidade, a privacidade, a honra do trabalhador, determinando, por exemplo, a utilização de uniforme indecente, que exponha partes íntimas; ou autorizando o monitoramento nos banheiros; não poderá a norma coletiva excluir a responsabilidade extrapatrimonial decorrente da violação de algum bem imaterial contido no inciso X do art. 5º da CF; Não poderá a norma restringir a liberdade do trabalhador, impedindo, por exemplo, o seu afastamento do local de trabalhado durante os intervalos; ou impedir a contratação ou promoção de algum trabalhador por motivo de crença, etnia, gênero ou opção sexual, etc.9
12. A REFORMA TRABALHISTA E SUAS INOVAÇÕES.
A Reforma Trabalhista de 2017, promovida pela Lei nº 13.467/2017, trouxe inúmeras alterações ao Direito do Trabalho, especialmente ao Direito Coletivo do Trabalho, que podem tangenciar a prevalência do negociado em relação ao legislado, merecendo destaque, como a alteração do entendimento em relação à dispensa coletiva que dependia de prévia negociação sindical, conforme construção jurisprudencial neste particular.
A mencionada alteração legislativa desestruturou parte do Direito do Trabalho como era conhecido, invertendo princípios, suprimindo regras, bem como dando ênfase à autonomia da vontade.
No tocante ao Direito Coletivo do Trabalho, a Lei nº 13.467/2017 incluiu a possibilidade da “dispensa em massa” sem prévia negociação coletiva, ou seja, hoje, o empregador tem a possibilidade de dispensar seus empregados, de forma coletiva,
8 Art. 611-B. Constituem objeto ilícito de convenção coletiva ou de acordo coletivo de trabalho, exclusivamente, a supressão ou a redução dos seguintes direitos:
9 CASSAR, Vólia Bonfim. Direito do Trabalho: de acordo com a reforma trabalhista. Lei 13.467/17. 15ª ed. Revistada, atualizada e ampliada. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2018. P.1252-1253.
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independentemente de acordo ou convenção coletiva de trabalho para que ocorra a referida modalidade de dispensa.
Há de se destacar que, antes da reforma legislativa, o Tribunal Superior do Trabalho (TST) possuía o entendimento de que deveria ocorrer prévia negociação coletiva para que fosse feita a dispensa coletiva de trabalhadores.
Portanto, ainda que a ocorrência de demissão coletiva tenha um impacto social significativo, principalmente nas microrregiões em que elas ocorrerem, por opção legislativa, conforme art. 477-A da CLT, a dispensa imotivada coletiva equipara-se, para todos os fins, às dispensas imotivadas individuais, em massa será não havendo necessidade de autorização prévia de entidade sindical ou de celebração de convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho para sua efetivação.
Outra novidade trazida pela Reforma Trabalhista foi a criação da singular figura do “trabalhador hipersuficiente”, previsto no parágrafo único do artigo 444 da CLT.
De acordo com o referido dispositivo legal:
A livre estipulação a que se refere o caput deste artigo aplica-se às hipóteses previstas no art. 611-A desta Consolidação, com a mesma eficácia legal e preponderância sobre os instrumentos coletivos, no caso de empregado portador de diploma de nível superior e que perceba salário mensal igual ou superior a duas vezes o limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social.
Em síntese, de acordo com o mencionado dispositivo legal, o denominado “trabalhador hipersuficiente” pode ser considerado como sendo aquele portador de diploma de nível superior e que perceba salário mensal igual ou superior a duas vezes o limite máximo dos benefícios do RGPS.
Em 2019, o limite máximo dos benefícios do RGPS é de R$ 5.839,45, conforme Portaria nº 9, do Ministério da Economia, publicada em 16/01/2019, no Diário Oficial da União.
Nas palavras de Homero:
o art. 444 diz mais do que pretendia, pois dá a impressão de ampla liberdade contratual, quando, na verdade, o contrato de trabalho, embora particular, tem forte ingerência pública10.
10 SILVA, Homero Batista Mateus da CLT comentada. 2ª ed. São Paulo : Thomson Reuters Brasil, 2018. P. 154.
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O mencionado autor, ainda afirmou precisamente que
a proposta do art. 444 é bem ambiciosa ao autorizar que o indivíduo, que cumpra os dois pressupostos contidos no referido artigo, possa fazer a mesma negociação estabelecida entre sindicatos (convenções coletivas) ou sindicatos e empregadores (acordos coletivos)11.
Isto porque, algumas matérias constitucionais, como a redução de salário, conforme já mencionado, são defesas às convenções ou acordos coletivos.
Igualmente defendendo a inconstitucionalidade, CARLOS HENRIQUE BEZERRA LEITE afirma que o parágrafo único do artigo 444 da CLT
é de induvidosa inconstitucionalidade por atritar com os arts. 1º, III e IV, 3º, IV, 7º, caput, e XXXII, e 170 da CF, os quais enaltecem a dignidade da pessoa humana, o valor social do trabalho, a função social da empresa e do contrato de trabalho, a proibição de discriminação de qualquer natureza e abominam qualquer ‘distinção entre trabalho manual, técnico ou intelectual ou entre os profissionais respectivos12.
No mesmo sentido, o enunciado de número 49 da 2ª Jornada de Direito Material e Processual do Trabalho prevê que
O parágrafo único do art. 444 da CLT, acrescido pela Lei 13.467/2017, contraria os princípios do Direito do Trabalho, afronta a Constituição Federal (arts. 5º, caput, e 7º, XXXII, além de outros) e o sistema internacional de proteção ao Trabalho, especialmente a Convenção 111 da OIT. II. A negociação individual somente pode prevalecer sobre o instrumento coletivo se mais favorável ao trabalhador e desde que não contravenha as disposições fundamentais de proteção ao trabalho, sob pena de nulidade e de afronta ao princípio da proteção (artigo 9º da CLT c/c o artigo 166, VI, do Código Civil).
A título de esclarecimento, o tocante à função da Organização Internacional do Trabalho (OIT), citada no enunciado acima, PORTELA ensina que
A OIT tem como objetivo principal estabelecer padrões internacionais mínimos para as relações trabalhistas e garantir melhores condições de trabalho em todo o mundo, com vistas a promover a dignidade humana, o bem-estar geral e a justiça social e, assim, contribuir para a paz mundial13.
11 LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Curso de direito do trabalho. 11ª ed. São Paulo: Saraiva, 2019. P. 173
12 LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Curso de direito do trabalho. 11ª ed. São Paulo: Saraiva, 2019. P. 270.
13 PORTELA, Paulo Henrique Gonçalves. Direito Internacional Público e privado: incluindo noções de direitos humanos e de direito comunitário. 10ª ed. rev. atual. e ampl. Salvador: JusPODIVM, 2018. P. 526.
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Ademais, a referida Convenção nº 111, aprovada por meio do Decreto Legislativo nº 104, de 1964, por sua vez, dispõe sobre discriminação em matéria de emprego e profissão.
Sobre o tema, PORTELA ensina que
A Convenção 111 define discriminação no trabalho como sendo toda distinção, exclusão ou preferência fundada na raça, cor, sexo, religião, opinião pública, ascendência nacional, origem social ou qualquer outra condição, que tenha por efeito destruir ou alterar a igualdade de oportunidades ou de tratamento em matéria de emprego ou profissão. [-] Todo país para o qual a Convenção se encontre em vigor se compromete a formular e aplicar uma política nacional que tenha por fim promover, por métodos adequados às circunstâncias e aos usos nacionais, a igualdade de oportunidades e de tratamento em matéria de emprego e profissão, com o objetivo de eliminar a discriminação nessa matéria14.
Diante de tais considerações, vê-se que a figura do “empregado hipersuficiente”, criada pela Reforma Trabalhista, viola não só a Constituição Federal, como também a Convenção 111 da OIT.
Cumpre ainda ressaltar que, embora o empregado que perceba, em dezembro de 2019, o valor de R$ 11.678,90 (onze mil, seiscentos e setenta e oito reais e noventa centavos) e detenha diploma de curso superior seja considerado trabalhador diferenciado, continua sob as dependências econômicas de seu empregador.
O princípio da autonomia da vontade determina que as partes possuem liberdade para contratar, desde que sejam respeitados os limites da ordem pública e dos bons costumes.
De acordo com o artigo 421 do Código Civil, recentemente alterado pela Lei da Liberdade Econômica, a liberdade contratual será exercida nos limites da função social do contrato, bem como que, nas relações contratuais privadas, deverão prevalecer o princípio da intervenção mínima e a excepcionalidade da revisão contratual.
O Código Civil também preceitua que na execução e conclusão do contrato, os contraentes devem observar os princípios da probidade e boa-fé.
No tocante ao Direito do Trabalho, em regra, as normas jurídicas estabelecem direitos indisponíveis. De acordo com o artigo 442 da CLT, “contrato individual de trabalho é o acordo tácito ou expresso, correspondente à relação de emprego”.
14 SILVA, Homero Batista Mateus da CLT comentada. 2ª ed. São Paulo : Thomson Reuters Brasil, 2018. P. 127.
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Já o artigo 444 da CLT, prevê que as
relações contratuais de trabalho podem ser objeto de livre estipulação das partes interessadas em tudo quanto não contravenha às disposições de proteção ao trabalho, aos contratos coletivos que lhes sejam aplicáveis e às decisões das autoridades competentes.
O dispositivo legal acima, com o advento da Reforma Trabalhista, passou a prever, no parágrafo único, que a autonomia de vontade do empregado portador de diploma de nível superior e que perceba salário mensal igual ou superior a duas vezes o limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social deve prevalecer.
Em outras palavras, no tocante às hipóteses previstas no artigo 611-A da CLT, a livre estipulação decorrente de vontade do trabalhador considerado “hipersuficiente” terá a mesma eficácia legal e preponderância sobre os instrumentos coletivos.
Contudo, o empregado, na condição de responsável pelo seu sustento e o dos seus familiares, terá, evidentemente, a autonomia de vontade mitigada eis que, objetivando a manutenção do emprego, poderá aceitar condições maléficas impostas pelo empregador.
Importante relembrar que o Código Civil impõe como anulável o negócio jurídico celebrado mediante coação, entendendo como coação o fundado temor de dano iminente e considerável à sua pessoa, à sua família ou aos seus bens.
Portanto, a meu ver o empregado, ainda que presentes os requisitos do art. 444 da CLT não tem autonomia para negociar alterações lesivas ao seu contrato de trabalho e, uma vez ausente a autonomia, resta prejudicado o acordo como um ato bilateral de vontades, prevalecendo, em verdade, a imposição do empregador.
13. DAS NEGOCIAÇÕES COLETIVAS E A FAZENDA PÚBLICA.
Sabe-se que o Poder Público é regido por regramento diverso do aplicado ao setor privado.
No tocante à aplicação do regramento das negociações coletivas aos empregados públicos, regidos pela CLT, e aos servidores públicos, regidos por regime estatutário, aparecem duas situações distintas.
Em razão da Convenção nº 151 da OIT, em 2012, o TST modificou a redação da OJ nº 5 da SDC, adotando o entendimento de que é possível o dissídio coletivo exclusivamente para que sejam apreciadas cláusulas de natureza social em face de pessoa jurídica de direito pública que possua empregados celetistas. Vejamos:
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5 – Dissídio coletivo. Pessoa jurídica de direito público. Possibilidade jurídica. Cláusula de natureza social. (Inserida em 27.03.1998. Redação alterada na sessão do Tribunal Pleno realizada em 14.09.2012. Res. 186/2012. DeJT 25/09/2012)
Em face de pessoa jurídica de direito público que mantenha empregados, cabe dissídio coletivo exclusivamente para apreciação de cláusulas de natureza social. Inteligência da Convenção nº 151 da Organização Internacional do Trabalho, ratificada pelo Decreto Legislativo nº 206/2010.
Por outro lado, com relação a pessoa jurídica de direito público que contrate sob o regime estatutário, o entendimento majoritário é no sentido de que não é possível a celebração de acordo ou convenção coletiva, por força do artigo 39, § 3º, da Constituição Federal.
O mencionado dispositivo constitucional não ampliou aos servidores estatutários a aplicação do artigo 7º, inciso XXVI, da CF, que versa sobre reconhecimento das convenções e acordos coletivos de trabalho.
Entretanto, nota-se que o TST tem flexibilizado esse entendimento. Sobre o tema, WENDOL PITON nos ensina que
a Seção de Dissídios Coletivos (SDC) do TST tem adotado uma postura de flexibilização em determinadas situações, ao entender que, uma vez que as cláusulas com conteúdo social não possuem repercussão econômica, poderiam ser objeto de negociação coletiva envolvendo servidores públicos estatutários (TST. RODC-2027000-18.2007.5.02.0000) 15.
Desse modo, vê-se que, com exceção das cláusulas de natureza econômica, em especial, os valores remuneratórios, matéria que é reservada à lei, por força do princípio da legalidade previsto no artigo 37 da CF, entende-se que as cláusulas de natureza social podem ser objeto de negociação coletiva por parte do Poder Público.
15 PITON, WENDEL. Direito Coletivo do Trabalho na Fazenda Pública; in Direito material e processual do trabalho na Fazenda Pública. Salvador: Editora Juspodivm, 2019, pág. 139.
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14. A INDEPENDÊNCIA SINDICAL NA NEGOCIAÇÃO.
Ao se conferir ao Sindicato o poder de celebrar acordos ou convenções coletivas com eficácia prevalecente em relação a lei, a Reforma Trabalhista aumentou o protagonismo sindical nas relações de trabalho.
Contudo, a alteração legislativa que tornou opcional e mediante prévia autorização o recolhimento da contribuição sindical, conforme disposto no art. 545 da CLT, foi um duro golpe aos Sindicatos que, assumindo uma posição de protagonismo nas relações de trabalho coletivas, perderam sua principal fonte de custeio, enfraquecendo e desestruturando àquele que a CF/88 incumbiu, nos termos do art. 8º, a defesa dos direitos e interesses coletivos ou individuais da categoria, inclusive em questões judiciais ou administrativas, sendo obrigatória a sua participação nas negociações coletivas de trabalho.
Assim, o que se viu em dois anos de vigência da Lei nº 13.467/2017 foi o enfraquecimento do direito sindical e, consequentemente, na capacidade deste de articular as negociações e assembleias para a celebração de convenções coletivas e acordos coletivos, inclusive, para regulamentar os itens permitidos com o advento da lei, em especial os dispostos no art. 611-A da CLT.
Pode se dizer que os sindicatos desestruturados e sem recursos podem ter a capacidade de negociação e defesa de seus representados mitigada em troca de uma ou outra vantagem econômica que possam receber para trabalharem a serviço do capital, ou seja, podem não negociar pensando exclusivamente nos interesses de seus representados.
15. DA DISCUSSÃO NO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL SOBRE O PRINCÍPIO DA PREVALÊNCIA DA NEGOCIAÇÃO COLETIVA – RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO (ARE) 1121633
Pautado para ser julgado em 04 de dezembro de 2019, sendo retirado de pauta em 28 de novembro de 2019, sem nova previsão para julgamento, o Supremo Tribunal Federal (STF) irá analisar a validade de norma coletiva de trabalho que limita ou restringe direito trabalhista não assegurado constitucionalmente.
Trata-se de matéria com repercussão geral reconhecida.
O assunto tratado no Recurso Extraordinário com Agravo (ARE) 1121633, de relatoria do ministro Gilmar Mendes.
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No caso dos autos, a Mineração Serra Grande S.A. questiona acórdão do Tribunal Superior do Trabalho (TST) que, ao manter decisão do Tribunal Regional do Trabalho (TRT) da 18ª Região (Goiás), afastou a aplicação de norma coletiva de trabalho que afastava o pagamento de horas de trajeto (in itinere) pelo tempo de ida ou de retorno do trabalho com veículo fornecido pela empresa.
No STF, a mineradora defende a manutenção do que foi pactuado em negociação coletiva e sustenta violação ao princípio da prevalência da negociação coletiva, contido no artigo 7º, inciso XXVI, da Constituição Federal, e ao da segurança jurídica, tendo em vista o possível temor dos empregados de firmar acordos diante do risco de ter sua validade negada pelo Poder Judiciário.
A empresa diz que está localizada a apenas 3,5km da zona urbana, o que possibilitaria que o trajeto fosse ser feito a pé ou por outros meios de transporte.
O julgamento deste recurso e efeitos declarados podem interferir diretamente na amplitude da prevalência da negociação coletiva em relação à lei.
16. CONCLUSÃO.
A Lei 13.467, de 13 de julho de 2017, publicada no Diário Oficial da União no dia seguinte, alterou substancialmente a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), aprovada pelo Decreto-Lei 5.452, de 1º de maio de 1943, e modificada ao longo dos últimos 74 anos.
Apresentada pelo Executivo em 23 de dezembro de 2016, o Projeto de Lei 6.787/2016, em pouco mais de seis meses, foi aprovado pela Câmara dos Deputados no final de abril de 2017 e pelo Senado Federal em 12 de julho do mesmo ano, sendo sancionada pelo presidente da República no dia 13 de julho de 2017.
Uma lei desta magnitude e importância social e econômica deveria ter sido amplamente debatida e discutida com a sociedade eis que afetava substancialmente o Direito do Trabalho, tanto nos aspectos materiais quanto na lei processual, não sendo objeto de qualquer alteração no Senado Federal.
O resultado disso foi uma lei, chamada de Reforma Trabalhista que, redigida às pressas, além de redação de clareza questionável, trouxe para a lei, a modernidade do teletrabalho sem retirar artigos, como exemplo, que tratam sobre as juntas de conciliação e julgamento, extintas com a EC/24, de 1999.
Por certo, como não seria possível ao legislador criar uma lei que pudesse atender toda cadeia produtiva e serviços, na mais variada forma de labor, a Lei nº 13.467/2017 trouxe
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como um de seus pilares a prevalência do negociado sobre o legislado, permitindo uma maior flexibilização dos direitos trabalhistas de forma a atender as especificidades regionais como também setoriais.
Como bem dizia o Desembargador aposentado do Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região, Marcos de Oliveira Cavalcante nas aulas ministradas, a vida é mais rica que o direito e os fatos reais são mais ricos do que a lei.
Assim, a possibilidade de, por intermédio dos sindicatos, celebra-se acordos e convenções coletivas de forma a atender os anseios e necessidades pontuais e específicas das empresas e empregados é de enorme valia e utilidade, podendo ser determinante na manutenção de empregos e sobrevivência das empresas.
O grande desafio é que esse permissivo legal para a prevalência do negociado sobre o legislado é que este não seja utilizado apenas para a redução de garantias de segurança e saúde do trabalho, bem como a redução da contrapartida pela força de trabalho caracterizando um “dumping social” caracterizado “pela adoção de práticas desumanas de trabalho, pelo empregador, com o objetivo de reduzir os custos de produção e, assim, aumentar os seus lucros16”.
Portanto, o que se espera é uma utilização sadia e democrática deste instituto de forma a garantir a melhoria da condição social dos trabalhadores, em estrito cumprimento ao pacto confederativo de forma a assegurar exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias, conforme insculpido no preâmbulo constitucional.
BIBLIOGRAFIA.
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal, 1988.
BRASIL. Decreto-Lei n. 5452, de 1º de maio de 1943. Aprova a Consolidação das Leis do Trabalho. Diário Oficial [dos] Estados Unidos do Brasil, Poder Executivo, Rio de Janeiro, DF, 9 ago. 1943.
16 NAMURA, José Roberto. Dumping social uma pratica desconhecida pelas empresas.
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BRASIL. Lei n. 13.467, de 13 de julho de 2017. Altera a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), Aprovada pelo Decreto-Lei no 5.452, de 1o de maio de 1943, e as Leis nos 6.019, de 3 de janeiro de 1974, 8.036, de 11 de maio de 1990, e 8.212, de 24 de julho de 1991, a fim de adequar a legislação às novas relações de trabalho. Diário Oficial União, Poder Executivo, Brasília, DF, 13 jul. 2017.
CARRION, Valentin. Comentários à Consolidação das Leis Trabalhistas: Legislação Complementar, jurisprudência. Ed. 43. São Paulo: Saraiva Educação, 2019.
CASSAR, Vólia Bonfim. Direito do Trabalho: de acordo com a reforma trabalhista. Lei 13.467/17. 15ª ed. Revistada, atualizada e ampliada. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2018.
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SILVA, Homero Batista Mateus da CLT comentada. 2ª ed. São Paulo : Thomson Reuters Brasil, 2018.
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NAMURA, José Roberto. Dumping social uma pratica desconhecida pelas empresas. Disponível em: http://www.migalhas.com.br/dePeso/16,MI217836, 21048-Dumping+Social+. Acesso em: 14\12\2019.

 

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao curso de Direito do Trabalho e Processo do Trabalho, de Pós-Graduação lato sensu, nível de especialização, da FGV Direito Rio como pré-requisito para a obtenção do título de Especialista.